Capelania Carcerária

Capelania Carcerária

 

Capelania Carcerária e a contribuição de John Wesley

“Os presos precisam mais do que ninguém ser visitados, porque eles são muitas vezes sozinhos e esquecidos pelo resto do mundo” (João Wesley)

A expressão Capelania Carcerária é sinônima de Pastoral Carcerária, sendo esta última de uso relativamente recente, cujo emprego mais frequente ocorre predominantemente no âmbito da Igreja Católica, pelo menos no Brasil. Na Inglaterra do século XVIII já existia uma Capelania Carcerária, uma vez que os estabelecimentos de reclusão penal contavam com os serviços religiosos oferecidos por intermédio da figura do capelão, um clérigo anglicano que cuidava dos serviços pastorais relacionados aos/às presos/as, serviços geralmente sediados nas capelas institucionais.

A palavra Capelania refere-se ao cargo exercido pelo/a capelão/ã e recebe sua adjetivação de acordo com o público-alvo do seu ministério. Daí Capelania Carcerária ter origem no trabalho que o/a capelão/ã realiza junto aos/às encarcerados/as ou presos/as. O autor prefere usar a expressão Capelania Carcerária por ser de largo emprego internacional, inclusive na América Latina, além de identificar um campo semântico que abrange as figuras do/a capelão/ã, da capela e do/a encarcerado/a.

John Wesley chegou a exercer o cargo de capelão quando esteve na Geórgia (1735-1738), por nomeação do General Oglethorp. Antes, porém, de viajar para lá, desenvolveu esse ministério de forma voluntária junto a diversas prisões da Inglaterra, o que significa ter ele exercido o ministério da Capelania Carcerária. Um colega seu, Willian Morgan, pioneiro do Clube Santo, já desenvolvia atividades religiosas junto aos/às presos/as antes de John Wesley ser envolvido nesse serviço. E foi Willian Morgan quem conseguiu – não sem muitos esforços – introduzir John Wesley nesse tipo de missão, fato que aconteceu em 1730, ano em que ele inicia suas visitas às prisões.

O local escolhido foi a Prisão do Castelo, e a data, o dia 24 de agosto daquele ano, marco inicial do envolvimento de John Wesley com essa obra, denominada por Duncan A. Reily de “capelania não oficial”. Foi muito grande o envolvimento de Wesley com a Capelania Carcerária: “Durante 9 meses, a partir de setembro de 1738, ele (John Wesley) visitou ou pregou nas cadeias de Londres, Bristol e Oxford não menos do que 69 vezes”.

Os registros biográficos de Wesley que incluem seu trabalho nas prisões oferecem indicativos que demonstram ter ele exercido a Capelania Carcerária até o final de sua vida, de maneira muito frequente e intensa, conforme verificamos no presente ensaio. A ocorrência de crimes na Inglaterra do século XVIII era generalizada, a legislação punia os/as criminosos/as de maneira muito severa e desumana, inclusive com a pena de morte. Os/as magistrados/as e o sistema penitenciário deixavam muito a desejar; enquanto isso, a população carcerária superlotava as prisões.
Wesley envolveu-se com a evangelização e apascentamento dos/as presos/as a partir de sua primeira visita à Prisão do Castelo, em Oxford. A expe­riência pastoral que teve com o trabalho realizado junto a um réu condenado à morte marcou para sempre seu coração de pastor e evangelista.

A dedicação pessoal de John Wesley à causa dos/as presos/as, além de harmonizar-se com seu discurso, é um exemplo possuidor daquela força carismática que penetra até os porões sub-humanos e imundos do nosso mundo; ali tal força se transforma em luz que ilumina as consciências, aquece os corações e faz ressurgir a esperança, a paz, o amor, a fé, a alegria, a vida, enfim! Por isso mesmo, o recado final deve ser dele, como se à nossa frente caminhasse na direção da população carcerária ansiosa por receber a graça de Deus:

 “Segunda-feira, 15 de outubro de 1759. Andei a pé até Knowle, boa milha distante de Bristol, para visitar os prisioneiros franceses. Mais de mil e cem, segundo fomos avisados, estavam reunidos num pequeno espaço, sem cousa alguma em que deitar, senão colchões de palha, e sem cobertores; para se cobrirem só tinham alguns trapos, quer de dia quer de noite, portanto, morreram como se fossem ovelhas atacadas de morrinha. Fiquei horrorizado; à tarde preguei sobre Êxodo 23:9: ‘Não oprimirás o peregrino; pois vós conheceis o coração do peregrino, visto que fostes peregrinos na terra do Egito’. Levantou-se uma coleta que rendeu dezoito libras, e no dia seguinte chegou a vinte e quatro. Com esta quantia compramos roupa de cama, cobertores, e pano, que foi convertido em camisas e calças; compraram-se também algumas dúzias de meias, e tudo isto foi distribuído entre aqueles mais necessitados. Logo depois a Congregação de Bristol mandou grande número de colchões e cobertores; e não demorou para chegar de Londres outras contribuições; e ainda mais; vieram contribuições de várias partes do reino. Portanto, creio que daqui em diante os soldados serão mais bem servidos”.

Por fim, bem à moda do Capelão Carcerário Wesley, ouve-se o apelo-convite: Que faremos nós para sensibilizarmos cristãos/ãs de outras denominações porventura ainda indiferentes com a dimensão social do Evangelho de Cristo? Ah! Se a maioria dos/as cristãos/ãs evangélicos/as do Brasil de hoje abraçasse a causa dos/as presos/as e de alguma maneira se engajasse nessa missão, certamente estaria dando um sentido horizontal à sua fé e canalizando a graça de Deus na direção de milhares de vidas, escravas e condenadas por diversas vezes e formas, porém, alvos da expressão fraterna e solidária do amor Deus.

Pr. Aluísio Laurindo da Silva | Presidente da ACMEB
Publicado originalmente no Jornal Expositor Cristão de maio de 2018

* BUYERS, Paul E. Trechos do Diário de Wesley, p.108/9.